REFLEXÕES, INTERVENÇÕES, ANALISES E OPINIÕES PESSOAIS

Esta segunda publicação trata-se de extractos  de uma intervenção efectuada, em Lisboa, a 30.01.1991
(vale a pena situar no tempo e reflectir com base na realidade actual
e reflectir sobre os  ataques que o Direito do Trabalho tem sido alvo nos últimos anos)

Nesta minha intervenção versarei alguns aspectos do Pacote Laboral, sendo de destacar a velha reivindicação patronal da introdução do despedimento por inadaptação ao posto de trabalho que será objecto de analise especifica.
Do conjunto de alterações a introduzir no novo regime jurídico das relações colectivas de trabalho relevo, negativamente, as normas da arbitragem obrigatória.
A consagração da arbitragem obrigatória sujeitaria as partes, que não tenham requerido a arbitragem voluntária, no prazo de dois meses após frustrada a conciliação e a mediação, aos objectivos do arbitro, que na maioria dos casos não é imparcial, dado como prevê o acordo e manter-se a proposta, será nomeado por despacho do Ministério do Emprego e Segurança Social.
Considerando as posições patronais defendidas ao longo da discussão do dito acordo social é de antever que procure - se possível - utilizar esta nova regra como forma de tentar limitar, entre outros, o direito à greve.
Em sectores com poucas tradições e caracteristicas  reivindicativas e naqueles onde sejam constantes as mutações de local de trabalho, a arbitragem obrigatória poderá ser uma limitação preocupante à livre negociação colectiva pendendo para o lado do mais forte (patronato).
O período experimental é outra das matérias que mais afectaria os sectores económicos onde predomina as empresas com menos de 20 trabalhadores, dado que o projecto prevê que nestas empresas o período experimental aumente para 90 dias...Possibilita, ainda, o alargamento do período experimental para 180 dias para cargos e funções de alta complexidade técnica ou elevado grau de responsabilidade. O período experimental subiria para 240 dias (8 meses) para o pessoal de chefia, direcção e quadros superiores.
Em sectores em clara mutação ou a entrar no mercado e para os quais são admitidos muitos trabalhadores, com saliência, para os jovens, a quem são exigidos conhecimentos técnicos e habilitações médias ou superiores, o projecto em discussão se entrar em vigor terá reflexos extremamente graves e transformará o período experimental num instrumento útil de precarização laboral, em alguns casos, mais conveniente do que os contratos a termo.
A instabilidade no emprego e a mutação na colocação no mundo do trabalho será uma constante.
As novas tecnologias que devem ser para os trabalhadores factores de progresso económico e social, de desenvolvimento das suas aptidões e responsabilidades económicas e sociais, tornam-se, hoje, fontes de dificuldades quando não mesmo instrumento de negação das suas garantias e direitos, mantendo-os em permanente instabilidade e incerteza em relação ao seu posto de trabalho. Deixará os trabalhadores com o "credo na boca" deixando-os à mercê da "gula" patronal e dos seus egoístas objectivos económicos.
O período experimental alargado permitirá uma constante rotação de trabalhadores no mesmo posto e local de trabalho, com a permanente instabilidade que provocará com os consequentes efeitos sociais, psicológicos e económicos que dai advém.
Nesta minha breve intervenção não posso deixar de referir a matéria do horário de trabalho. A redução do horário de trabalho para as 40 horas semanais é um objectivo crucial do movimento sindical e social, embora em muitos sectores fruto da luta já sejam praticados horários de trabalho inferiores às 40 horas.
No entanto, o projecto do Governo a par de uma medida positiva e reclamada de redução do horário de trabalho prevê como contrapartida imediata ao patronato a introdução, extremamente gravoso, para os trabalhadores o regime da adaptabilidade.
O projecto do governo vai mesmo mais longe do que o texto consagrado no chamado acordo económico e social, ao determinar, por exemplo:
  • O horário de trabalho pode ser aumentado até 2 horas diárias sem aviso prévio nem pagamento extra;
  • O horário de trabalho semanal pode ser alargado até 50 horas semanais sem aviso prévio nem pagamento extra.
  • O dia ou dias de descanso semanal podem deixar de coincidir com o sábado e domingo e passem a ser outros, em função do horário fixado pela entidade patronal.
Estes projectos são maus e inaceitáveis, mas ainda estamos a tempo de lutar e impedir a sua aplicação...

Lisboa, 30.01.1991
António Neto





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